Como é conhecido de alguns, minha
mãe de criação não foi formalmente apresentada às letras; portanto, não sabe
ler e escrever e, por isso, guarda, para as palavras escritas, aquele respeito
que se tem ante ao mágico e desconhecido. Ela lutou, a vida toda, para que
todos aqueles muitos filhos e filhas, dela e de outros – que coube-lhe criar e
educar –, frequentassem as cadeiras escolares e aprendessem o que ela quis e
não pôde deter: a leitura. Desde que chegou aqui em casa, indaga-me sobre um
livro de antologia, no qual, 20 poucos anos atrás, saíram três textos ruins de
minha autoria. Dói só de lembrar. A “façanha literária” hoje frequenta algum
lugar esquecido da minha estante. Como eu me recusara a procurar o livro, para
que ela, tendo-o à mão, pudesse seguir exibindo orgulhosa o “enorme talento” do
sobrinho “poeta”, ela, hoje, parou em frente à estante, contemplando-a. Vi,
pelo canto do olho, que que tia Hilda tateava, com os olhos, as várias lombadas
dos muitos livros para reconhecer o seu troféu de mãe que tem um filho “escritor”.
Levantei, caminhei até ali e retirei o livro do lugar onde foi por mim
esquecido – mas, por ela, não. Entreguei-lhe enquanto ela me dizia: “é que essa
sua poesia mexe comigo”. Ganhei o domingo, claro: numa estante frequentada por
Drummond, Bandeira, Dostoievski, Shakespeare e tantos outros, ser o autor
preferido de alguém mexe com os brios de qualquer um. Quem precisa de Prêmio
Nobel quando já tem uma tia-mãe-fã?
Itanhaém (SP), 6 de agosto de 2017.
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