quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Corrigindo os próprios erros




Que desespero ler o meu próprio currículo e ver uma infinidade de erros: vou precisar contratar um revisor de textos... Bom, em casa de ferreiro, o espeto é sempre de pau. Com tantos textos dos outros para ler, quem disse que sobra tempo para os meus. Só de poemas, tenho uns 200 esperando que um dia eu os olhe com mais amor e calor e lhes dê um destino: o lixo ou a luz. Mas o currículo, cedo ou tarde também vai precisar sofrer uma faxina. Quem sabe quando...
Universidade de São Paulo
Faculdade de Educação
Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa I




Seqüência Didática
Poesia: figuração e conceito


São Paulo – 2003

O primeiro passo consiste na avaliação diagnóstica, que deve permitir verificar o que a classe já sabe sobre poeta/poesia e, principalmente, deve servir para o professor colher informações acerca dos alunos, que o permita proceder à organização de grupos de alunos com uma composição heterogênea em relação ao assunto poesia.

Para tanto o professor deve ter em mãos uma espécie de “mapa em branco”. Os modelos desse tipo de mapa podem variar de acordo com a situação da classe. Trata-se de uma lista de presença em que possam ser feitas colunas paralelas aos nomes dos alunos, as quais serão denominadas pelos tipos de informações que as questões levantadas na avaliação diagnóstica podem suscitar. Por exemplo, as colunas podem ser: a) exemplos dados pelos alunos (se apropriados ou inapropriados); b) quando forem apropriados, se simples, complexos, comuns, etc; c) conceitos emitidos pelos alunos (se apropriados ou inapropriados); d) quando forem apropriados, se simples, complexos, comuns, etc. O mapa também pode ser uma folha em branco na qual o professor possa anotar as ocorrências e as falas dos alunos. O importante é poder registrar o que a classe já sabe sobre o tema e o grau desse saber, identificando que alunos estão com maior ou menor familiaridade com o assunto, de maneira a distribuí-los pelos futuros grupos. As perguntas precisam ser abertas e provocativas. Podem ser, por exemplo: a) alguém sabe o que é poesia?; b) para quê serve poesia?; c) quem escreve poesia?; d) quem lê poesia?; e) quem sabe o nome de um autor de poesia?; f) quem sabe alguma poesia?, etc. Uma vez que as perguntas são abertas, podem conduzir a novas perguntas na medida das respostas dos alunos. Se a classe responde que conhece um escritor, por exemplo, a próxima pergunta pode ser como se deu o contato com esse escritor, como é o texto dele, etc. Se a classe começa a citar escritores, esse momento vai servir para verificar a adequação ou não dos nomes citados à condição de escritor de poesia e desse conjunto de respostas poderá se separar aqueles alunos que já conhecem e entendem poesia e sabem fazer a distinção entre um texto em prosa e um texto em poesia. As citações também podem misturar autores nacionais e estrangeiros, mortos e vivos, clássicos ou modernos, regionais ou mais universais, etc. Tudo isso poderá servir para formar o grupo de maneira mais heterogênea.

A próxima etapa consistirá na distribuição para a classe de um texto em poesia. Esse texto deverá ser selecionado em consonância com o “gosto” literário que a turma esboçou durante a avaliação diagnóstica ou com o nível de conhecimento sobre o tema. Para tanto, a seleção de exemplos trazida pelo professor deve ser bastante ampla e diversificada. Por exemplo: se a classe demonstrou algum grau de familiaridade com a poesia que tenha como tema o amor e com a estrutura ritmada, o texto a ser apresentado pelo professor pode ser qualquer um que privilegie o tema “amor romântico”, os versos rimados etc. Poderá apresentar à classe, por exemplo, “Soneto de fidelidade”, de Vinicius de Moraes. Se a noção de poesia da classe comporta textos em versos livres, tanto por ser uma demanda, tanto por ser o modelo preferido pela turma, a escolha poderá recair sobre algum nome da poesia moderna, Carlos Drummond de Andrade, por exemplo. O importante é estabelecer uma conectividade entre a escolha do texto apresentado e a noção da classe sobre o tema.
Nessa etapa o professor, após selecionar o texto, o transcreverá na lousa, com as seguintes instruções: a) copie o texto “Soneto de fidelidade” no seu caderno; b) Faça uma ou duas leituras silenciosas; c) identifique as palavras que lhe são estranhas ou novas ou cujo o sentido lhe pareça “diferente”; d) faça uma lista com essas palavras; etc.

Ao mesmo tempo em que direciona a atenção do aluno para a produção literária de um escritor, dando suporte material para a compreensão de conceitos que serão transmitidos a seguir, essa atividade permitirá que o professor envolva os alunos numa tarefa individual enquanto o próprio professor irá processar as informações que colheu na avaliação diagnóstica, de modo a poder criar os grupos. Os grupos deverão ser compostos por 5 alunos, em função da qualidade das respostas e, também, de outras informações que o professor possa ter dos alunos (tratando-se de uma turma de alunos já conhecida). Dessa forma, um grupo terá alunos que demonstram algum conhecimento apropriado do tema, alguma leitura, alguma facilidade de manusear as informações acerca do tema, com alunos que tem características justamente opostas: dificuldades com o assunto, desconhecimento do assunto, etc. Sendo uma classe já conhecida do professor, será interessante evitar agrupamentos que geraram conflitos em experiências anteriores, a fim de se evitar que se consolide na mente dos membros uma visão negativa do trabalho em grupo.

Na próxima etapa já há a formação das equipes. A primeira tarefa do grupo formado será a de trabalhar com os resultados da questão acerca de palavras “estranhas” encontradas no texto proposto. Parte-se do princípio de que as respostas variarão, uma vez que o grupo tem pessoas em situações diferentes com relação ao tema. A discussão do grupo irá ampliar ou diminuir o conjunto de palavras trabalhadas. Ou seja: se a questão, conforme foi apresentada no presente exemplo, for a localização e formação de uma lista de palavras estranhas ou desconhecidas, muito provavelmente os alunos com dificuldades apresentarão uma lista maior que os alunos com facilidade. Na discussão, um aluno explicará o sentido ao outro e a dúvida será sanada. Portanto, a lista diminuirá. Mas se a atividade anterior, ainda individual, pedisse para localizar outros tipos de itens, como conceitos mais específicos -- por exemplo, rimas internas, os alunos com menos traquejo no tema apresentaria uma lista menor que o aluno com mais facilidades e a discussão em grupo aumentaria a lista.
Durante esse tempo o professor atuará como mediador das questões e dos debates, auxiliando os alunos na depuração dos resultados. Durante essa mediação o professor poderá verificar que tipo de abordagem adotará na próxima etapa, quando da sua explanação acerca do assunto para toda a classe. Perceberá se deve explicar mais a poesia enquanto forma, significado ou interpretação. Também poderá, dessa verificação, surgir a necessidade de explicar mais sobre o autor ou o contexto do texto apresentado, etc. Ou ainda, começar a estabelecer relações entre este gênero com outros ou, ainda, entre um dado movimento literário com o outro. Mas a etapa da explanação do professor, da conceituação do tema, deve se prender a esse momento concreto que é a demanda dos debates dos grupos.

Uma nova etapa será a produção escrita. A base de trabalho pode ser originada do material coletado pelos alunos ainda no momento da atividade individual. Ou seja, dependendo do que fora solicitado para ser buscado pelo aluno, esses dados poderão ser utilizados na etapa de produção escrita. Por exemplo, poderia ter sido solicitada, para uma classe do último ciclo do ensino fundamental, que fosse localizado no texto exemplos de metáforas sobre um dado assunto, ou exemplos de palavras utilizadas num sentido diverso do usual para expressar determinada noção. Assim, na etapa da produção escrita os grupos seriam chamados a criar um texto fazendo uso dos mesmos recursos ou utilizando as palavras localizadas como um vocabulário básico do texto a ser criado, mas alterando seus significados. No caso dos alunos do terceiro ciclo do ensino fundamental, pode ser sugerida a reescritura do texto a partir da elucidação dos termos desconhecidos.
Uma vez que a questão tenha sido explicada para a classe, os alunos do quarto ciclo podem, ainda, trabalhar com tema ou mote do texto e produzir uma nova poesia com o mesmo tema. Ou desconstruir o texto da sua forma de poesia e transformá-lo num texto em prosa, para se marcar a diferença entre uma forma e outra.
O importante é que essa etapa signifique a possibilidade de uma ou mais formas de criação, para que os alunos possam intuir a melhor maneira de trabalhar com o tema. O professor também acompanhará in loco os trabalhos em grupo, com intervenções pontuais, esclarecendo dúvidas e corrigindo erros, num processo que possibilite a reescrita, na busca do aprimoramento do texto.

A última etapa de trabalho será a apresentação do produto desenvolvido pelo grupo, que poderá ser uma dramatização, uma declamação, etc, dependendo do trabalho final.

É importante notar que a avaliação do professor não recairá sobre apenas esse momento, o produto final. O professor deve ter tomado notas do envolvimento dos alunos no processo e, principalmente, deve verificar como entraram e como saíram determinados alunos. Se aqueles alunos que tinham dificuldades conseguiram ter alteradas as suas informações acerca do tema, se puderam compreender o assunto, isso seguramente deverá ser um ponto importante da avaliação. E os alunos devem saber desse critério de avaliação.
Data: 26/06/2003

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